“Não é raro ouvirmos histórias de bullying por aí, bem como situações discriminatórias sobre raça, gênero, religião, natalidade, números na conta bancária, peso na balança, cabelo branco, olho puxado, capacidade intelectual... toda diferença, absolutamente toda diferença de alguém em relação a outro é motivo de chacota ou, pior, de violência moral, psicológica e física. O que eu não imaginava era viver tão cedo uma situação assim. Foi simples, bem simples perto do que a gente houve por aí, mas deixou em mim uma marca.
Foi na escola da minha filha, em fevereiro de 2018, no período de adaptação, que é quando os menorzinhos vão dar início ao período letivo num novo colégio e começam devagarinho até estarem tranquilos para dizerem “tchau, mamãe” e começarem a explorar o mundo de uma outra forma. Pois bem, no primeiro dia, os pais ficam na porta da sala das crianças enquanto os pequenos entram e saem quando querem, numa espécie de reconhecimento de território com a segurança dos pais por perto. Eu estava sentada conversando com outros pais, conhecendo a turma, quando Giovanna saiu da sala de mãos dadas com a professora, se entrelaçou nas minhas pernas, olhou pra cima, sorriu, ganhou um beijo meu na testa, se sentou e saiu andando de bumbum no chão. Na época, ela não andava sozinha ainda. Foi então que uma das mães, sentada sozinha no canto direito da porta, levantou os olhos por cima do celular e observou Giovanna andando de bumbum. Então, naquela quase primeira hora de adaptação, falou suas únicas palavras, sem soltar as mãos do aparelho:

- É sua filha?
- Sim, é a Giovanna.
- Ela tem quantos anos?
- Um ano e sete.
- E ela vai estudar nesta sala?
- Vai.
- Nesta aqui? – vocês podem imaginar o semblante feliz dela, não é?
- Sim, e vai ser amiga do seu filho.

Ela voltou os olhos para o celular e seguiu sem dizer uma só palavra. E eu? Senti pena. Porque não dá nem pra ficar brava com gente assim, gente que não enxerga além do próprio umbigo. Não dá para exigir respeito, não dá para exigir carinho... É preciso que a gente queira aprender o que é respeito, para então passar a sentí-lo e, aí sim, a respeitar. Mas dá pra gente mostrar algo diferente, ah, isso dá. Então, pensei comigo, vou dar a ela o melhor de mim, quem sabe assim ela não muda de ideia?
E comecei. Cada vez que cruzava com ela no corredor, era “oi” e um sorriso. Nada. De novo “Oi, tudo joia?” e um sorriso. Nada. “Oi, fulano (mexia com o filho dela), que bom que você está aqui! Olha seu amigo, Nana”. O pequeno correu para dar a mão para minha filha. Ela? Soltou um sorriso amarelo. E no outro dia, Giovanna, eu e o filho dela repetíamos as cenas. O sorriso amarelo foi tomando um outro tom, outro brilho e, um dia, foi ela que mostrou ao filho que Giovanna estava chegando na escola e disse a ele “vai lá com sua amiga”. E eu ainda ganhei um oi de verdade. Hoje, já está tudo bem. Nós conversamos, nossos filhos também. Talvez ela tenha aprendido uma lição. Talvez. Eu aprendi: as armas do bem é que devemos usar para mostrar um mundo bom. “Olho por olho, e o mundo acabará cego” – Mahatma Gandhi.” Camila Castro / Blog Um em Mil.

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